quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Multiplicidade e Duração

É, por estes cristais bem recortados e este congelamento superficial, uma continuidade que se escoa de maneira diferente de tudo o que já vi escoar-se. É uma sucessão de estados em que cada um anuncia aquele que o segue e contém o que o precedeu. A bem dizer, eles só constituem estados múltiplos quando, uma vez tendo-os ultrapassado, eu me volto para observar-lhe os traços. Enquanto os experimentava, eles estavam tão solidamente organizados, tão profundamente animados com uma vida comum, que eu não teria podido dizer onde qualquer um deles termina, onde começa o outro. Na realidade, nenhum deles acaba ou começa, mas todos se prolongam uns nos outros (BERGSON, 1974, p. 22).

Bergson, segundo Deleuze (1989, p. 29), chega à noção de multiplicidade qualitativa não somente por oposição à multiplicidade numérica, mas a partir da distinção entre sujeito e objeto. O objeto é aquele que pode ser dividido infinitas vezes, sem se desnaturar, conseqüentemente, um objeto ao dividir-se somente muda de grandeza, não muda de natureza. Este objeto será chamado, então, de multiplicidade numérica, porque segue o modelo do número que se divide sem mudar de natureza. Mesmo que estas divisões não cheguem a se realizar, mas somente sejam pensadas como possíveis, o aspecto total do objeto não muda, pois somente o seu grau varia. Por outro lado, podemos pensar um tipo de "divisão" da duração psicológica ocorrendo no sujeito, num sentido metafórico e não espacial de divisão. A vida psíquica, apesar de contínua, é múltipla em seus aspectos, portanto, e de certa forma, divide-se para formar uma multiplicidade. Entretanto, esta divisão é muito especial porque a duração ao dividir-se muda de natureza; se não mudasse permaneceria homogênea e seria, então, uma multiplicidade numérica. A verdadeira duração é heterogênea e a cada divisão podemos no momento considerá-la como indivisível. Nesta divisão, que na realidade é uma mudança essencial, surge "o outro" sem que com isto venham a existir "muitos" no sentido numérico, porque os "muitos" estados fundem-se num só e cada novo estado de consciência toma conta da alma inteira, resultando num mesmo e único estado que dura. Assim, a multiplicidade qualitativa consegue conciliar características aparentemente divergentes da duração psicológica: a heterogeneidade e a continuidade.

ROSSETTI, Regina. Bergson e a Natureza Temporal da Vida Psíquica. Psicol. Reflex. Crit., Porto Alegre , v. 14, n. 3, p. 617-623, 2001 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-79722001000300017&lng=en&nrm=iso>. access on 15 Nov. 2019. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79722001000300017.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

The post-orgasmic prolactin increase following intercourse is greater than following masturbation and suggests greater satiety

The post-orgasmic prolactin increase following intercourse is greater than following masturbation and suggests greater satiety

Abstract

Research indicates that prolactin increases following orgasm are involved in a feedback loop that serves to decrease arousal through inhibitory central dopaminergic and probably peripheral processes. The magnitude of post-orgasmic prolactin increase is thus a neurohormonal index of sexual satiety. Using data from three studies of men and women engaging in masturbation or penile–vaginal intercourse to orgasm in the laboratory, we report that for both sexes (adjusted for prolactin changes in a non-sexual control condition), the magnitude of prolactin increase following intercourse is 400% greater than that following masturbation. The results are interpreted as an indication of intercourse being more physiologically satisfying than masturbation and discussed in light of prior research reporting greater physiological and psychological benefits associated with coitus than with any other sexual activities.
Stuart Brody, Tillmann H.C. Krugers. Brody, T.H.C. Kruger / Biological Psychology 71 (2006) 312–315
Simultaneous Penile–Vaginal Intercourse Orgasm is Associated with Satisfaction (Sexual, Life, Partnership, and Mental Health)


Introduction.
Previous multivariate research found that satisfaction was associated positively with frequency of
specifically penile–vaginal intercourse (PVI; as opposed to other sexual activities) as well as with vaginal orgasm. The contribution to satisfaction of simultaneous orgasm produced by PVI merited direct examination in a large representative sample.
Aims.
To examine the associations of aspects of satisfaction (sexual, life, own mental health, partner relationship) with consistency of simultaneous orgasm produced by PVI (as well as with PVI frequency and vaginal orgasm consistency).
Methods.
A representative sample of Czechs (N=1,570) aged 35–65 years completed a survey on aspects of
satisfaction, PVI frequency, vaginal orgasm consistency, and consistency of simultaneous orgasm produced by PVI (the latter being a specially timed version of vaginal orgasm for women).
Main Outcome Measures.
Analysis of variance of satisfaction components (LiSat scale items) from age and the
sexual behaviors.
Results.
For both sexes, all aspects of satisfaction were associated with simultaneous PVI orgasm consistency and with PVI frequency (except female life satisfaction). All aspects of satisfaction were also associated with vaginal orgasm consistency. Multivariate analyses indicated that PVI frequency and simultaneous orgasm consistency make independent contributions to the aspects of satisfaction for both sexes.
Conclusions.
For both sexes, PVI frequency and simultaneous orgasm produced by PVI (as well as vaginal orgasm
for women) are associated with greater life, sexual, partnership, and mental health satisfaction. Greater support for these specific aspects of sexual activity is warranted.

Brody S and Weiss P. Simultaneous penile–vaginal intercourse orgasm is associated with satisfaction (sexual, life, partnership, and mental health). J Sex Med 2011;8:734–741.


segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Mas, contra essa ideia da originalidade e da imprevisibilidade absolutas das formas, toda nossa inteligência se insurge. Nossa inteligência, tal como a evolução da vida a modelou, tem por função essencial iluminar nossa conduta, preparar nossa ação sobre as coisas, prever, com relação a uma situação dada, os acontecimentos favoráveis ou desfavoráveis que podem se seguir. Instintivamente, portanto, isola em uma situação aquilo que se assemelha ao já conhecido; procura o mesmo, a fim de poder aplicar seu princípio segundo o qual "o mesmo produz o mesmo". Nisso consiste a previsão do porvir pelo senso comum. A ciência leva essa separação ao mais alto grau possível de exatidão e precisão, mas não altera seu caráter essencial. Como o conhecimento usual, a ciência retém das coisas apenas o aspecto repetição. Se o todo é original, arranja-se de modo a analisá-lo em elementos ou em aspectos que sejam aproximadamente a reprodução do passado. Só pode operar sobre aquilo que presumidamente se repete, isto e, sobre aquilo que, por hipótese, está subtraído à ação da duração. Escapa-lhe o que há de irredutível e de irreversível nos momentos sucessivos de uma história. Para representar-se essa irredutibilidade e essa irreversibilidade, é preciso romper com hábitos científicos que respondem as exigências fundamentais do pensamento, fazer violência ao espírito, escalar de volta a inclinação natural da inteligência.

Bergson. Henri.  A Evolução Criadora: tradução Bento Prado, Martins Fonte, São Paulo, 2005. p32


Compreende-se que um tema lírico percorra toda a obra de Bergson: um verdadeiro canto em louvor ao novo, ao imprevisível, à invenção, à liberdade. Não há aí uma renúncia da filosofia, mas uma tentativa profunda e original para descobrir o domínio próprio da filosofia, para atingir a própria coisa para além da ordem do possível, das causas e dos fins. Finalidade, causalidade, possibilidade estão sempre em relação com a coisa uma vez pronta, e supõem sempre que "tudo" esteja dado. Quando Bergson critica essas noções, quando nos fala em indeterminação, ele não nos está convidando a abandonar as razões, mas a alcançarmos a verdadeira razão da coisa em vias de se fazer, a razão filosófica, que não é determinação, mas diferença. Encontramos todo o movimento do pensamento bergsoniano concentrado em Matéria e Memória sob a tríplice forma da diferença de natureza, dos graus coexistentes da diferença, da diferenciação. Bergson nos mostra inicialmente que há uma diferença de natureza entre o passado e o presente, entre a lembrança e a percepção, entre a duração e a matéria: os psicólogos e os filósofos falharam ao partir, em todos os casos, de um misto mal analisado. Em seguida, ele nos mostra que ainda não basta falar em uma diferença de natureza entre a matéria e a duração, entre o presente e o passado, uma vez que toda a questão é justamente saber o que é uma diferença de natureza: ele mostra que a própria duração é essa diferença, que ela é a natureza da diferença, de modo que ela compreende a matéria como seu mais baixo grau, seu grau mais distendido, como um passado infinitamente dilatado, e compreende a si mesma ao se contrair como um presente extremamente comprimido, retesado. Enfim, ele nos mostra que, se os graus coexistem na duração, a duração é a cada instante o que se diferencia, seja porque se diferencia em passado e em presente ou, se se prefere, seja porque o presente se desdobra em duas direções, uma em direção ao passado, outra em direção ao futuro. A esses três tempos correspondem, no conjunto da obra, as noções de duração, de memória e de impulso vital.



Deleuze, Gilles. Bergsonismo; tradução de Luiz B. L. Orlandi. - São Paulo: Ed. 34, 1999




Enfim, a consciência e essencialmente livre; é a própria liberdade; mas não pode atravessar a matéria sem se pousar sobre ela, sem se adaptar a ela: essa adaptação é o que se chama intelectualidade; e a inteligência, voltando-se para a consciência atuante, isto é, livre, a faz naturalmente entrar nos quadros nos quais costuma ver a matéria se inserir. Perceberá portanto sempre a liberdade sob a forma de necessidade; sempre negligenciará a parte de novidade ou de criação inerente ao ato livre, sempre substituirá a ação mesma por uma imitação artificial, aproximativa, obtida compondo o antigo como antigo e o mesmo como mesmo. Assim, aos olhos de uma filosofia que se esforça para reabsorver a inteligência na intuição, muitas dificuldades se desvanecem ou se atenuam. Mas uma tal doutrina não facilita apenas a especulação. Dá-nos também mais força para agir e para viver.

Bergson. Henri.  A Evolução Criadora: tradução Bento Prado, Martins Fonte, São Paulo, 2005. p292


Que tipo de faculdade permitiria ao homem ultrapassar o plano da adaptação? Qual é a fonte da sua abertura excepcional à incógnita absoluta dos objetos virtuais? Em que escarpa virtuosa realiza-se o triunfo sobre o mecanismo e a necessidade? Como o compasso acertado entre a inteligência e a atividade funcional se dobra a plasticidade de uma forma imprevisível? De que modo a linha do homem se mostra capaz de “baralhar os planos”, dando passagem ao impulso vital que lhe atravessa no rumo de uma “direção aberta”? 



Torelly, Gabriel. Memória e fabulação em Henri Bergson: considerações sobre a experiência do tempo no ensino de História. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, Porto Alegre,  2014.








Benivaldo do Nascimento Junior

Então, o que é a Verdade Absoluta? De acordo com o Budismo, a Verdade Absoluta é que não há nada absoluto no mundo, tudo é relativo, condicionado e impermanente ou que não existe nada que seja imutável, eterno, uma qualquer essência tal como Individualidade, Alma ou Ãtman, interior ou exteriormente.

É esta a Verdade Absoluta. A verdade nunca é negativa, embora possa ser expressa, na linguagem comum, pela negativa. Ver a Verdade, i.e., ver as coisas como elas realmente são (yathãbhütam), sem ilusão ou ignorância (avijjã), é a eliminação do desejo ardente, “sede” (Tanhakkhaya) e a cessação (Nirodha) de dukkha, a qual é Nirvana. Será útil e oportuno relembrar aqui o entendimento Mahãyãna de Nirvana, segundo o qual este não é diferente de Samsãra; são a mesma coisa, Samsãra e Nirvãna, sendo a sua diferenciação somente o resultado do modo como se olha - subjectiva ou objectivamente. Esta visão Mahãyãna foi provavelmente desenvolvida a partir das ideias veiculadas nos textos originais em Pali da Theravãda, aos quais nos temos vindo a referir na nossa breve análise.

É incorrecto pensar que Nirvãna é o resultado natural da eliminação do desejo. Nirvãna não é o resultado de coisa alguma. Se fosse um resultado, então seria um efeito produzido por uma causa. Seria então samkhata, “produzido” e “condicionado”. Nirvãna não é nem causa nem efeito. Está para além de causa e efeito. Não é criado, ao contrário dos estados mentais místicos ou espirituais, tais como dhyãna ou samãdhi. A VERDADE É. NIRVÃNA É. A única coisa que se pode fazer é vê-lo, realizá-lo. Existe um caminho que conduz à realização de Nirvãna. Mas Nirvãna não é o resultado desse caminho.

RAHULA, Walpola. O Ensinamento de Buda. Editorial Estampa, Lda., Lisboa, 2005. p88-89













Benivaldo do Nascimento Junior